terça-feira, 30 de setembro de 2008

Caminhão de Mudança


"Quer mudar? Ligue para nós!"

Assim dizia o anúncio. Lógico: mil planos, idéias e incertezas começaram a pulular em sua mente.

E se ela ligasse? E se ela realmente mudasse? E se ficasse pior? Não, pior do que já estava não ficaria. Ficaria sim. Ela era tão novinha, cheia de sonhos e criatividade...


E se ficasse melhor? Ah, iria ficar melhor!

Mas e se desse errado? E se parecesse muito artificial, robótico, plástico?! Ué, plástico muda - muda porque é plástico.

Ia ligar. Antes, claro, perguntaria o valor. Quanto vale uma mudança? Aceita-se moedas mutáveis? Deveria... Afinal, a bolsa sempre oscila.

Esperou dar o tempo dos seus pensamentos se reorganizarem e discou o número anotado.

Queria mudar. Há anos queria mudar.

Queria tanto mudar que nesses quereres acabou mudando várias vezes. Justamente, esse tanto de mudanças a deixava constantemente inconstante. E insatisfeita.

Agora ia mudar de vez. Um toque. Dois. Três. Iam atender. Iam atendê-la.


Desligou. Ficou com medo da voz que atenderia. E se perguntassem o que é que ela queria mudar?! Nunca saberia!

Melhor não mudar. Não com um caminhão de mudanças... Era muito pra ela!

Melhor esperar passar uma bicicleta, subir na garupa, deixar o vento mudar - mudar pelo menos seu penteado.

Ou ficar muda - o que não muda nada.

Liga ou não liga?

Liga. E ela lá foi menina de prometer e não cumprir?

- Boa tarde, serviço de mudanças, Gertrudes, quem fala?

- Ahm, é, oi... Eu queria saber, vocês fazem o quê para as mudanças?

- Vamos em domicílio, embalamos tudo, guardamos, encaixotamos, guardamos, colocamos no caminhão, entregamos, arrumamos no novo domicílio e depois os meninos cobram a gorjeta e dormem.

- Dormem na casa?

- Não, no caminhão.

- E quanto custa?

- Depende da distância e da quantidade de coisa.

- Ah, eu sou bem acessível e pequena. Não devem ser muitas coisas. Contam os pensamentos?

- Pensamentos é o quê? De cozinha, sala ou quarto?

- Cabeça.

- Ah... Esses eu não sei. Tem que ver com o superior. Eu posso estar te enviando para ele...

Estar te enviando? Não, ela não falou isso, falou? Quem a Gertrudes pensa que é?! Por acaso aquilo era um serviço de telemarketing? Ah, não. Desligou.

E mudou. Mudou, pelo menos, de planos: nada de caminhões por hoje.

2 comentários:

Fontes disse...

Se a Alice fosse dona do mundo ele seria bem mais engraçadinho.

Maria Joana disse...

esses seus textos são muito bons. dos que te fazem sorrir no final. ^^