terça-feira, 20 de maio de 2008

Erros Certos (ou Certos Erros)


- Por que você não toma vergonha na cara?

- Como assim?

- É isso mesmo. Vergonha na cara.

- O que foi que eu fiz dessa vez?

- Dessa vez? Dessa vez e sempre. Viu só como você sabe que sempre faz coisa desse tipo? Até falou o "dessa vez". Ou seja, além de tudo você reconhece seu erro e continua repetindo-o.

- Erro? Que erro?

- Esse que é o maior problema. Errar é humano, não é isso que dizem? Agora, errar eternamente, aí não, pelamordedeus, aí é por que tem algum problema. E não é só um erro. Antes fosse. São vários. Todo dia. Sempre. Não dá tempo nem para desculpar que já vêm outros. Não, eu não aguento. Sabe o que é chegar em casa cansada depois de um dia estressante de trabalho, com aquele chefe infernal reclamando na sua orelha, o café frio em cima da mesa, por que você sabe, né?

- O quê?

- O café! Que o café esfria e eu não tenho nem tempo para buscar outro. Quer dizer, eu não tenho nem tempo de tomar o café, senão ele não ficaria frio. Mas é claro que você sabia. Eu já tinha comentado sobre isso. Tá vendo como você não me escuta?! Eu falei!

- Mas você não tinha coment...

-...E ainda tem a coragem de dizer que EU não tinha comentado?! Você não tem jeito mesmo. Eu bem que devia ter escutado a sua mãe. Aliás, você ligou pra ela? Provavelmente não, coitada. Graças a deus que eu não tenho um filho igual a você. Se bem que nem filho eu tenho. Sabia que a Glorinha teve uma menina?

- Não..

- Não? Sabia sim! Pode falar, é claro que sabia. E deve ter sido o primeiro a ficar sabendo. Ou você não joga mais futebol com o Rogério? Não acredito. Não posso nem imaginar em uma hipótese dessa. Por acaso você está me enganando? Dizendo que vai jogar uma pelada...Ah! Agora eu entendi sobre a pelada de quarta. Não, não pode ser. Diz que não é verdade. Descaradamente! E eu, com minha boa vontade, apoiando sua vida menos sedentária! Não, não é possível. Quem é a desgraçada?! O que eu fiz pra merecer isso? Por quê? Qual é meu problema?

- Nenhum...

- Então por que você me deixa aqui sozinha vendo aquela droga de novela nas quartas pra sair com outra?!

- Mas que outra?!

- Aquela. Como que outra?! Você mesmo admitiu que não vai jogar futebol com seus amigos durante às quartas, então pra onde você vai? Visitar alguma creche, asilo? Fazer trabalho voluntário?

- Não, a gente joga sim. Você não tinha comentado que eu até estava com mais fôlego, com menos barriga...

- Isso não se consegue só com umas partidinhas de futebol! E fôlego..não pode ser! Então é verdade!

- É sim.

- É SIM? Você está saindo com uma lambisgóia e me trocando?!

- Não! É verdade que depois do trabalho, eu vou jogar bola.

- Que bola?

- Futebol! Que coisa! Deixa de ser paranóica, eu não estou saindo com ninguém!

- Como não? E você joga sozinho, então?

- Não se faça de desentendida.

- Você que está agindo como se não soubesse de nada.

- O que eu deveria saber?

- Tudo.

- Tudo? Impossível saber tudo. Ninguém sabe de tudo.

- Pelo menos as coisas que eu falo! Você deveria me escutar mais, e não fingir que está escutando.

- Eu escuto!

- Não! Você não ouve e parece que eu estou falando com as paredes. Aliás, até as paredes me entendem mais do que você. Falando nisso, você não disse que ia pintar nossa casa?

- Nossa?

- Ai, essa casa. Pronto, melhor assim? Sem responsabilidades que o "nossa" carrega? Viu como você é infantil? Então, como eu tinha dito, a filha da Glorinha, a Gabriela...mas que mania de colocar filho com a mesma letra da mãe. Quero ver quando ela tiver outros. Vai chegar num ponto que nem nome vai existir mais com a letra G. Se bem que ela não vai ter mais filhos. Nem sei como conseguiu ter essa menina...você não acha?

- Acho o quê?

- Da Glorinha! Que ela não ia ter filhos. Mas você não presta atenção em nada mesmo, viu. Pois eu pensei que nem fosse ter. A gente tem que ir um dia lá no hospital.

- Hospital? Por quê? Alguém está doente?

- Pra visitar a Glorinha! Ou você acha que ela vai ficar lá pra sempre? Se bem que poderia. É errado falar mal das pessoas, mas aquela mulher, ah, ela merece. Onde já se viu? Tratar o marido daquele jeito, eu, hein. Quer dizer, eles se casaram?

- O Rogério e a Glorinha? Acho que sim.

- Quando? E nem nos chamaram? Como que eles tiveram a coragem de não nos chamar? Deve ter tido uma festa e tanto, a família dela parece que é rica, não é? Mas quando foi esse casamento? A gente estava aqui em São Paulo? Ou foi em algum feriado em que a gente teve que visitar sua família naquela roça desgraçada? Deve ter sido em maio. Maio tem o quê? Dia do Trabalho, Corpus Christi...não, ela não ia se casar em nenhum feriado. Por que a gente não foi?

- Acho que não teve festa..

- Como não? Acha que não ia ter?! Ia sim! Só pra ela ter que jogar o buquê na cara das solteironas. E a Vanessa! Eu não te contei!

- O que aconteceu?

- Encalhada. De novo. O problema é que aí ela afunda no chocolate e fica feito uma baleia. Uma baleia encalhada.

- Não fala assim da sua amiga...

- Não, mas é verdade. Ai, o que tá acontecendo comigo? Tem razão, ela não merece esse tratamento. Mas eu falo pra ela que não é assim que ela vai conseguir ser feliz...Por que eu ando desse jeito?! O que foi que eu fiz? Ela sempre foi tão boazinha comigo. Sempre me ajudou. Que nem aquele dia em que, pera, não foi ela que nos apresentou? Num era aniversário do irmão dela? Como é o nome dele mesmo? Não importa. Viu só, ela sempre foi uma amiga excepcional.

- Já que você pôde me conhecer?

- Não! Você só pensa em você! É "eu, eu, eu" o tempo todo. Onde foi que eu errei?

- Você errou? Não tinha sido eu o erro personificado?

- Tinha. Quer dizer, é! Ah! Ou somos dois? Dois erros perambulando por essa vida.

- Meu erro é você.

- Não. Você é meu erro.

E não tomaram vergonha na cara, na alma, no choro ou no riso. Continuaram se amando.

[assim como eu não tomei e continuarei nessa falta de overdose palavreira]

2 comentários:

Maria Joana disse...

nossa! se eu fosse homem não aguentaria uma mulher dessas falando na orelha! XD

Alice Agnelli disse...

Se você fosse homem, poderia fazer xixi de pé!