(I)
Olhou bem para a mãe, que se perdia em meio a tantos pensamentos enquanto cozinhava o arroz. A cadeira, gigante, a esperava. Empurrou o mostrengo para perto do interfone e começo a escalá-lo.
-Num vai cair...
Não deu ouvidos. Como todas as crianças, ela não precisava se preocupar com o fato de se machucar, não tinha motivos para previnir-se -ainda era tão pequena que se curaria em instantes de qualquer coisa. Colocou o joelho na cadeira, puxou seu corpo com os braços para que a outra perna alcançasse a mesma posição deste e subiu. Finalmente. Do alto, avistou sua mãe. Quase podia enxergar como ela enxergava. Quase não, porque ainda faltavam uns bons decímetros, mas os 50cm de cadeira já eram um avanço.
-Cuidado, filha...
Não desceu. Ainda não havia atingido sua meta: o interfone. Estendeu os braços. Ficou na ponta dos pés. A cadeira andou, fazendo um ruído horrososo, agudos, daqueles que fazem quando são arrastadas nos chãos das cozinhas. Segurou-se no aparelho. Cambaleou.
-Desce daí! Não quero ter que levar filha minha pro hospital! Querida, vem pra cá, vem, fica aqui pertinho.
A mãe largou a panela, observar só não adiantava, tinha que agir. Viu que ela tirara o interfone do gancho. Parou.
-Por favor, você poderia ligar para o 192?
Seus olhos se encheram de lágrimas. Sua filha, pela primeira vez, ligando para a amiga. Interfonando para a vizinha. Por livre e espontânea vontade. Sozinha. Sem a ajuda de ninguém. E tinha apenas 2 anos. 2 anos!? Esqueceu-se dos machucados, da filha chorando no chão caso caísse, dos excessivos cuidados de mãe coruja. Era sua bonequinha, agindo como uma mocinha, atingindo seus objetivos, e deixando-a orgulhosa. Toda a preocupação tranformara-se em satisfação. Em apenas alguns segundos.
-Mãe, ela vai vir pra cá. Me ajuda a descer? -disse, estendendo os braços.
Recebeu mais: um abraço.
(II)
-Não tiro.
-Tira sim, vai. Você já está grandinha. Já está mais do que na hora de largar essa chupeta. Pelo menos para dormir. Me dá.
-Ah mãe, eu durmo sim com a minha chupeta. Você só pede pra que eu tire porque não sabe o que é dormir sozinha. Você tem o papai para te acompanhar. Eu tenho a minha chupeta.
E continuou acompanhada por um bom tempo.
(III)
-Em boca fechada não entra mosca.
-E também não entra chocolate!
[melhor do que ouvir histórias é saber que você era a personagem.]
6 comentários:
...
Acho que a parte I foi a coisa mais bonitinha que li em muito tempo! E isso é um elogio, e dos bons!
Parabéns...
Beijos.
Você continua sendo sapeca.E espertinha.E pequenina.
E de uma originalidade!
O que mais preciso dizer?Que eu agradeço por ter te conhecido?
Sim, sou definitivamente sortudo!
Besos smallice!
Alice, que fofa, você!!!
Depois dessa, com certeza vai ser madrinha do meu filho ;p
poxa, e que menina prodígio... com 2 anos e já ligando *_*
mas pelo jeito só tem prodígio mesmo nessa usp... dps de ler seu blog e o do túlio, estou cada vez mais convencida da minha sorte em ter conseguido passar!
bjuxx, élice :D
Smallice!!!
Estava falando.. todos esses jornots são blogueiros e eu não sabia. linkando você. só não li o texto agora pq to fazendo o tal do trabalho do eduardo
Beijo
ahhh. tomei vergonha na cara e vim ler o texto. Nossa, você era mesmo criança prodígio! dois anos interfonado.. sabia até o apartamento da amiguinha! ... o máximo de bonitinho que eu fazia era falar errado!
Gostei dos 3, do I principalmente.
Um sentimento diferente, de nostalgia, alegria e tristza num domingo aparentemente comum.
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